- Majestade! Majestade, por favor, atenda-me!
- Que queres de mim, Edward? Não sabes que horas são?
- Por favor, senhor, abra a porta! É sobre vossa Rainha.
O Rei abre a porta de seus aposentos:
- Aconteceu algo?
- O pior, senhor! O pior!
- Ela despertou.
- Exatamente!
- Certificou-se de que ela está perfeitamente trancada e
amordaçada?
- Provavelmente, Majestade, sua senhora já deve ter
arrebentado as correntes. Nossas únicas esperanças são os 250 guardas
instalados na torre.
- Os cidadãos, eles estão evacuando o reino?
- Creio que sim... Meu Deus! Majestade, é melhor nos
apressarmos!
- IREI A LUGAR NENHUM! SAIREI DESTE CASTELO APENAS QUANDO
MINHA ESPOSA ESTIVER NOVAMENTE DESACORDADA!
- Senhor, eu imploro! Não ouviu? Ela está a massacrar todos
os seguranças!
- Onde está o Padre Fredo quando mais precisamos de sua
presença?
- Convoquei-o para exorcizar sua senhora, no seu último
ataque. Após o ocorrido, o Padre fugiu.
Mais gritos de desesperos vindos da torre leste, perto dos
aposentos do rei.
- Majestade, mais de 100 homens estão à espera no salão
principal no palácio, esperando para lutar pelo senhor, pelo Reino. Por favor,
imploro que o senhor também deva honrá-los.
- Edward, nada mais pode ser feito pela minha esposa...
quero apenas que me retire daqui e que avise aos guardas que poupem-na de uma
morte dolorosa, mesmo que a pobrezinha já esteja morta. Que satã abandone-a de
vez e se ponha em seu devido lugar, que é no mais profundo inferno.
Todas as luzes à vela do palácio se apagam de repente.
- Majestade! Majestade! Onde estás?
- Estou bem atrás de ti. Segure minha mão para me
guiar.
- Sua carruagem provavelmente está à sua espera, lá fora.
Terei de ficar aqui para controlar sua senhora. Li que o tipo de entidade que a
possuiu apenas escapa dos ambientes pela porta da frente, e se esta for aberta
pelo dono da residência. Em hipótese alguma, senhor, abra a porta. Deixe que um
soldado abra-a para vossa Majestade.
- Minha senhora está morta, Edward. Irás comigo, pois é o
único homem cuja confiança é inacabada.
- Mais soldados virão para impedir a... criatura... sair do
palácio e...
O pronunciamento de Edward fora interrompido por barulhentos
passos vindos da escadaria que dava acesso aos aposentos.
- Ela está aqui, na torre!
- O que faremos, Edward? O que faremos?
- Teremos de nos
aproveitar da escuridão. Espero que a criatura não consiga enxergar no escuro.
Por um momento, pareceu que tanto o Rei quanto seu fiel
guarda-costas estivesse pensando na mesma solução para se livrar da besta.
Porém, o homem de coroa reluzente se opôs:
- Não façamos isto! Morreremos!
- Ela não nos verá. – Contradisse Edward.
- Como tem certeza?
- Não tenho, Majestade. Agora, devemos ir!
Aproveitando-se da completa falta de luz, Edward decidiu
colocar seu plano suicida em ação. Ao abrir breve e lentamente a porta dos
aposentos reais, percebeu a sombra de uma pessoa andando pelo teto, usando além
das pernas os braços, como um quadrúpede. A movimentação dessa criatura variava
de lenta para rápida.
- Ela está no teto, senhor. Temos a chance de correr até a
entrada da torre e seguir para o saguão principal do castelo.
- Tudo bem.
Assim, os dois homens, cuidadosamente, caminharam até o
início (ou término, para quem sobe) da escada e correram. Enquanto corriam,
escutavam a criatura com seus passos de aranha segui-los e emitir um perturbador
ruído enquanto o fazia. Por sorte, Edward e o Rei conseguiram ser mais rápidos,
chegando ao fim da escadaria e sumindo na escuridão, aos olhos da besta.
- O que faremos, então?
- Não fale, majestade!
Mas era tarde. Um vulto extremamente rápido passou por entre
os homens e, numa fracção de segundos, capturou um dos dois.
- MAJESTADE!
- AH, MEU DEUS!
- MAJESTADE, NÃO FIQUE AÍ! FUJA! SAIA DO...
O mandamento de Edward
fora interrompido quando cabeça, arremessada contra uma parede do castelo,
tornou-se uma mera pasta acumulada de miolos e sangue. A rainha possuída
aproveitou aquela carne fresca que ainda se encontrava em seus braços e começou
a devorá-la.
O Rei, por outro
lado, não sabia para onde ir, até avistar tochas vindas de um corredor próximo:
eram os últimos seguranças do castelo, a maioria estava morta (O Rei pisava em
seus restos espelhados pelo chão sem perceber, por causa do choque) ou teria
guiado os habitantes reino para longe. Um dos guardas perguntou ao Rei abatido:
- Majestade, ficarei com o senhor até a situação amenizar.
Os guardas deverão recapturar sua esposa viva, eu sei disso.
- Não! Mate aquele monstro de uma vez por todas! – Ordenou o
Rei. – Minha mulher já está morta. Se a criatura escapar deste castelo, irá
atrás dos cidadãos, mesmo que estes já estejam longe.
Obedecendo às ordens
do Rei, os seguranças do castelo foram à caça da criatura que, totalmente solta
e descontrolava, liquidava qualquer um que tentasse lhe deferir um golpe de
espada.
De repente, um pedaço
da lâmina da arma de um guarda morto em ação, jogado pela Rainha, voou em
direção ao Rei, que fora salvo pelo segurança que ficara para defendê-lo. O
objeto, porém, perfurou o crânio do bravo homem, que caiu como a um boneco de
pano no chão, formando uma poça de sangue ao seu redor.
O Rei, sozinho, sem
esperanças, esperava a sua vez; porém, esta não veio. A criatura havia sumido!
Seria impossível ter saído do castelo, pois não havia uma saída ou entrada
aberta. Totalmente decidido do que fazer, o homem apanhou as tochas caídas dos
guardas e começou a incendiar as longas e avermelhadas cortinas do saguão principal
de seu castelo, para por um fim naquele pesadelo, se uma vez, por todas. Em
menos de 5 minutos, todo o saguão estava em chamas. O fogo se espalharia por
todos os andares e torres, esperava o Rei. O homem, que jamais esperou que tamanha
tragédia fosse um dia acontecer, outra vez, com uma mulher de sua família (apesar de no primeiro acontecimento ter havido uma "cura"),
despediu-se da sua esposa em silêncio e saiu do castelo, lutando para não olhar
para trás.
Antes de colocar um
pé para fora da porta da frente da residência, que abriu antes de verificar se
a temida criatura estava por perto ou não, o Rei sentiu algo encostar seu ombro
direito e puxá-lo com tanta força que quase o derrubou no chão. Ao virar-se
para ver o que estava acontecendo, deparou-se com horripilante figura feminina,
de pele cinzenta e ferida, olhos fundos e vermelhos com olheiras, cabelos
desarrumados. O Rei quis gritar, mas não conseguiu, além de ficar paralisado,
com os olhos esbugalhados, centrados naquela visão aterradora.
- Ainda não tive a chance de me despedir, querido. – Disse a
criatura, decapitando o Rei com uma única mordida, cuspindo sua cabeça para o
lado e jogando o resto de seu corpo para as chamas que tomavam conta do
castelo.
- Adeus! – Continuou. – Sou grata por manter a porta aberta,
para mim.
Sentindo o cheiro de
camponeses, plebeus e soldados em fuga, a criatura resolveu sair para se
divertir com todos e, após o entretenimento, destruir e aterrorizar outras vidas e tomar novos reinos.