terça-feira, 20 de maio de 2014

Godzilla - Crítica

  Quando vi a notícia de que o “Rei dos Monstros” estaria de volta às telas de cinema em um remake Hollywoodiano, fiquei primeiramente preocupado; mas, após lembrar-me que nada ficaria pior que o Godzilla de Roland Emmerich, filme que deveras envergonha o clássico japonês de 1954 e demais derivados, de 1998, percebi que não havia motivos para preocupação. Porém, para mim, também não havia motivos para esperar um longa-metragem digno, que superasse todas as expectativas, até porque eu não possuía uma sequer. Tudo isso mudou quando comecei a acompanhar mais a divulgação do Godzilla de Gareth Edwards. Trailers, imagens, comerciais e vídeos promocionais pareciam mostrar de pouco a pouco o que estaria por vir em um dos filmes que, graças à ótima publicidade, tornou-se um dos mais esperados do ano.

 Tal divulgação, porém, ao mesmo tempo fora positiva e negativa em relação ao filme. O lado bom da publicidade foi deixar o público extremamente curioso para conferir o novo filme, esperando ver muita pancadaria entre monstros, cenas de ação e mares de clichês à lá Círculo de Fogo e Transformers; o lado ruim é também justamente esse que acabei de falar. Muita gente que espera assistir ao Godzilla de Edwads esperando ver um filme de ação, onde o monstro aparece constantemente e participa de forma ativa nas cenas de destruição do filme, pode se decepcionar, pois o longa é, antes de mais nada, uma homenagem ao clássico de 1954, dirigido por Ishirô Honda. Tanto a construção da criatura como a trama envolvendo o pesadelo nuclear são notavelmente fieis à obra japonesa de 60 anos atrás.

  O novo longa prefere mostrar além da conhecida história do Godzilla, que envolve testes nucleares e a irresponsabilidade do homem com a natureza, dramas familiares que, apesar da pouca exploração deste, conta com uma “monstruosa” atuação do ator Bryan Cranston (o eterno Walter White, de Breaking Bad), que, no filme, após perder a esposa em um “acidente” na fábrica na qual trabalhava, fica obcecado para descobrir o que realmente causou a morte da mulher e o abandono por radiação da cidade em que morava, além de um equilíbrio adequado entre tais dramas e a história que aborda a temática científica, onde temos o ator asiático Ken Watanabe no papel do cientista japonês Ishiro Serizawa (referência clara ao personagem Daisuke Serizawa-hakase, cientista do primeiro filme, interpretado por Akihiko Hirata) que foi incluído na trama com a finalidade de dar um ar oriental, ou seja, familiar ao filme, além de ter, mais ou menos, a mesma sacada que Steven Spielberg teve em Contatos Imediatos de Terceiro Grau: a de colocar um cientista estrangeiro no meio da história, que tem interesse em estudar as criaturas e não destruí-las. Não se pode deixar de notar a atuação um tanto teatral e espantada de Watanabe, que resulta em de seus melhores trabalhos.

 Falando em Steven Spielberg, é evidente que Gareth Edwards teve total influência do veterano diretor em seu novo filme. Pode-se fazer inúmeras associações de Godzilla com, além de Contatos Imediatos, Tubarão, onde a criatura que dá título ao filme vai aparecendo aos poucos até se revelar e participar do momento clímax do longa-metragem, o que acontece exatamente com o filme de Edwards. Não só o Rei dos Monstros, como as outras duas criaturas com quem Gojira confronta (dois monstros chamados Mutos, que se reproduzem por meio de energia nuclear) vão se revelando aos poucos com o decorrer do filme e da maneira mais peculiar possível. Não vemos aparições longas e imediatas dos monstros, mas estes são mostrados ao público de maneira nova e interessante, como em reflexos de vidros e aparelhos de TV. A cada cena de revelação das criaturas, o clímax fica mais intenso, até chegar, finalmente, onde muita gente estava esperando: no quebra pau! Mas nada disso, para mim, importou, e sim a beleza que cada sequência em que os monstros aparecem aos poucos traz. Edwards tem, deveras, um potencial gigantesco para explorar bestas gigantes nas telas, sem falar em criar um ambiente pós-apocalíptico extremamente bem feito e saber dosar de forma adequada e sem exageros os efeitos visuais que, obviamente, são belos de se ver. O que não funciona, infelizmente, é a tecnologia em terceira dimensão; há muitas cenas escuras no filme que não caem bem quando vistas em 3D. Porém, assistir a primeira aparição do Godzilla em IMAX, assim como as já mencionadas revelações do monstro de pouco a pouco, dá uma certa “grandeza” ao longa-metragem.

 Ainda sobre os recursos visuais, o fotógrafo Seamus McGarvey (Os Vingadores) não poupou uma monstruosa cinematografia, destacando a sequência do halo-jump que já pode ser considerada memorável para os gêneros ficção científica e “filmes-catástrofe”. Também não posso deixar de mencionar a trilha sonora do compositor francês Alexandre Desplat à lá John Williams, que acompanha a tensão do filme e se intensifica a medida que o longa se desenvolve. Quanto aos tão “polêmicos” cortes repentinos no momento em que acontece o confronto entre os monstros e não é mostrado, saibam que quando algo é realmente bom, claro que fica para o final. Particularmente, achei a falta de ação envolvendo o monstro que dá título ao filme necessário por duas coisas: Primeiro, para, digamos, aumentar o nível de curiosidade de quem já conhece os filmes antigos da criatura e quer muito vê-lo em ação num momento realmente digno ou, até mesmo, inesperado; segundo, para evitar os tão irritantes clichês de filmes de ação, que, como já mencionei, igualaria o filme, que é a reinvenção de um clássico, a outros longas-metragens atuais de sucesso turbinados de cenas de ação e efeitos visuais enjoativos, onde nada além de vultos computadorizados podem ser vistos.
 
  Apesar de Godzilla fugir do clichê da pancadaria, o filme não consegue deixar de ter aquela clássica repetição de melodramas familiares, presentes em quase todos os filmes-catástrofes. A intenção do roteiro era, provavelmente, por em foco as histórias dos personagens humanos, mostrando cada um com sua “luta” quando os monstros aparecem. Muitos pensam que Bryan Cranston é o foque principal do drama, porém a aparição do ator, apesar de ser memorável, é curta e quem tenta esforçadamente roubar a cena é o ator Aaron Taylor Johnson, que interpreta o filho do personagem de Cranston. A princípio, vemos o personagem de Johnson, um tenente desarmador de bombas, relacionar-se com sua esposa e filho. Tal relação, porém, consegue ser no mínimo água com açúcar e não faria diferença em estar no filme ou não (de preferência não, para evitar as mesmices de “reencontro” familiar após apocalipse, no final). Johnson, porém, em cenas de ação, consegue participar ativamente e de certa forma que o faz dividir o cargo de “herói” do filme com o próprio Godzilla.

  Uma das diferenças da nova versão para a antiga é, por incrível que pareça, a tonalidade mais “leve” do terror; por exemplo, na versão clássica, há uma cena em que uma mãe está abraçada aos filhos, no meio da cidade que está prestes a ser destruída por Gojira e, chorando, a mulher fala às crianças que “logo elas se encontrarão com o pai”. Tal fato, porém, não torna o filme menos aterrorizante em alguns momentos. Quanto ao roteiro, claro que há falhas, algo praticamente inevitável em filmes do gênero, porém nada que comprometa no bom desenvolvimento do longa.

  Godzilla de Gareth Edwards foi, definitivamente, um filme realizado para os verdadeiros fãs do monstrengo e não tenho certeza se o longa irá atrair novos admiradores que estão nunca assistiram ao original ou a uma das tantas sequências. Creio que os japoneses sentirão, finalmente, orgulho e podem até pensar na possibilidade de perdoar Hollywood pela catástrofe que foi a versão de 1998. Enfim, o novo longa-metragem nos volta com os ensinamentos que a série do Rei dos Monstros proporciona ao público, mas, desta vez, com as belas palavras do personagem de Ken Watanabe: "O erro do homem é achar que ele controla a natureza e não o contrário.".

Godzilla (Godzilla/Gojira)
Direção: Gareth Edwards
Produção: Jon Jashni, Mary Parent, Brian Rogers e Thomas Tull
Roteiro: Max Borenstein
Trilha Sonora: Alexandre Desplat
Elenco: Aaron Taylor-Johnson, Bryan Cranston, Elizabeth Olsen, Ken Watanabe, Juliette Binoche, David Strathairn, Sally Hawkins, entre outros.
EUA, Japão, 2014 – 2h 03 minutos

Nota: 8/10

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