A nova onda dos prelúdios (que, para falar a
verdade, não é mais tão nova) de clássicos do cinema está aumentando cada vez
mais, porém não ao ponto de causar um tsunami e com isso deixar os filmes
anteriores nas profundezas do esquecimento. Produções antológicas da história
do cinema continuam bastante frescas na memória de muita gente, mesmo essas
tendo prelúdios e remakes, ora necessários e bem feitos ora desnecessários e
completamente dispensáveis.
Posso afirmar, sem exageros cinéfilos de minha
pessoa, que, em 2011, os fãs da franquia “Planeta dos Macacos”, que teve início
com o longa-metragem de Franklin J. Schaffner em 1968, foram presenteados com Planeta
dos Macacos – A Origem (Rise of the Planet of the Apes), prelúdio do
diretor Rupert Wyatt que serviu como “base” para os filmes da franquia
original, pondo a tentativa frustrada de Tim Burton de fazer um remake (em
2001) no total esquecimento, felizmente. Se A Origem mostrou apenas os
primórdios da história dos símios de inteligência sobre humana, porém de forma
bastante envolvente e prezando o desenvolvimento da história a partir do
personagem César (o chimpanzé líder de uma revolução, interpretado por ninguém
menos que o lendário Andy Serkis), logicamente que o segundo filme mostraria um
certo “avanço” na já conhecida história, isto é, mostrando como finalmente os
humanos foram escravizados pelos símios e a evolução destes para um estágio
mais avançado. Porém, felizmente, não é bem isso que vemos em O Planeta dos
Macacos – Confronto (Dawn of the Planet of the Apes).
Quem estiver se pergunto por que diabos
escrevi “felizmente”, deve entender que a expressão foi utilizada por realmente
fazer jus ao que, não só eu, como muitas outras pessoas que gostam da franquia
Planeta dos Macacos e fortemente apoiam o estrondoso sucesso dos prelúdios, devem ter sentido ao ver que o segundo filme não cometeu o erro de explicar tudo ao
mesmo tempo, deixando espaço para os outros filmes da série e, com isso, explorando
cada vez mais o processo de evolução dos macacos, fórmula que foi claramente
usada em Planeta dos Macacos – O Confronto e fez o filme se diferenciar
dos demais.
No filme, agora dirigido por Matt Reeves
(Cloverfield), ambientado aproximadamente 10 anos após os acontecimentos de A
Origem, mostra a humanidade à beira da extinção devido à gripe símia originada
da droga criada para combater o Alzheimmer, no primeiro longa. Em um tenebroso
cenário pós-apocalíptico, duas sociedades vivem: uma lutando pela sobrevivência
(humanos), outra pela evolução (macacos). Enquanto os macacos vivem em uma colônia,
agora mais inteligentes e comunicativos uns com os outros, tendo César (Serkis)
como líder, os humanos que sobreviveram à quase extinção estão reunidos nas
ruínas de São Francisco; quando os dois mundos acidentalmente se encontram,
evitar uma guerra é tudo que macacos e humanos querem, porém há quem discorde
da ideia de paz.
Claro
que, através de uma simples sinopse, muitos devem considerar que o novo Planeta
dos Macacos não poupa o clássico clichê de dois grupos que convivem
pacificamente até algo dar errado e, com isso, uma batalha ser travada. Sim,
realmente tal clichê está presente no filme; porém, da forma que vejo, era
inevitável a presença dessa temática no filme, pois, caso contrário,
ocasionaria justamente o que eu anteriormente disse: um excesso de acontecimentos
quando ainda há muito que ser explorado nos próximos longas da série. Há quem
acredite que o filme perdeu muito tempo ao focar no cotidiano nos macacos, que,
de fato, é bastante explorado principalmente nas cenas iniciais do longa, desde
a tradicional caça presente em filmes do Planeta dos Macacos (dessa vez, para
caçar antílopes) até o momento do ataque; não há, porém, motivos para reclamar
de um fato que, por incrível que pareça, conseguiu ser novo nos filmes da
franquia tanto antiga quanto nova. Nunca vimos o cotidiano dos macacos como é
apresentado em O Confronto, principalmente levando em conta que estes estão cada
vez mais alcançando um elevado estágio de evolução, compartilhando seus
conhecimentos com os mais jovens e protegendo a fortaleza por eles construída.
A vida dos símios à lá National Geographic (quem dera o Big Brother explorasse
criaturas inteligentes) foi bem idealizada e desenvolvida ao longo do filme.
Vimos o comportamento da macacada em A Origem ser brevemente explorado, o que
deixou muita gente de queixo caído devido à técnica usada para a criação e
desenvolvimento das criaturas; ao longo do primeiro filme, porém, mal demos
conta de que os macacos são criados digitalmente, pois a naturalidade, não
apenas dos movimentos, mas das expressões, mostrando que os personagens criados
digitalmente têm mais emoções que os humanos, é simplesmente notável e, assim,
admirável.
Em O Planeta dos Macacos – O Confroto, a
técnica de captura de movimentos é repetida, sendo percebível um incrível
avanço na mencionada naturalidade, que já era bem feita há 3 anos. Agora, os
personagens criados digitalmente são tão reais que é impossível perceber que todas
as criaturas são computadorizadas. Mais uma vez, os macacos demonstram mais
sentimentos e simpatia com o público do que os personagens humanos. Falar que
Andy Serkis está novamente brilhante como César já é tão clichê quanto repetir
que o ator (que também deu vida a outros icônicos personagens, como Gollum,
King King e Capitão Haddock) merece pelo menos uma indicação ao Oscar ou ao
Globo de Ouro por seus trabalhos; o destaque para o novo filme também vai para
o personagem antagonista, Koba, macaco vítima de experiências em laboratório no
primeiro filme, que ainda guarda enorme rancor pelas cicatrizes deixadas pelos
humanos. Interpretado por Toby Kebbell, Koba, assim como a maioria dos macacos
do filme, demonstra um avanço evolutivo que o permite raciocinar e falar, porém
suas habilidades são usadas a favor de seu desejo de por um fim definitivo a
espécie humana e tirar César do poder, por acreditar que seu representante “ama
mais humanos do que macacos”. A revelação do personagem como o grande vilão da
trama chega a ser surpreendente e até arrepiante, mostrando que Koba foi o
primeiro de muitos símios a dar dor de cabeça aos humanos e o precursor da
guerra que ocasionou a morte da maioria destes. Além do protagonista e do
antagonista, também estão no filme o orangotango Maurice (clara referência ao
personagem de Maurice Evans, o Dr. Zaius, no filme de 1968), cujos movimentos e
expressões são dados pela atriz Karin Konoval, que, assim como os macacos de sua
espécie no clássico de J. Schaffner, é responsável pela educação do grupo e o
chimpanzé Rocket, interpretado por Terry Notary; há também novos símios na
história, como Olhos Azuis (referência ao apelido dado ao personagem de
Charlton Heston), o filho adolescente de César interpretado por Nick Thurston que
não sabe qual caminho seguir.
No lado dos humanos, temos o grupo de
refugiados na cidade de San Francisco que lutam para não contrair o vírus da
gripe símia e fazem de tudo (ou o possível) para evitar um conflito com a raça
que está em maioria. Mesmo possuindo bastantes armas, os humanos necessitam de
energia para se comunicar com o mundo exterior e pedir apoio militar, caso aconteça
uma rebelião por parte dos macacos. A história conta com um grupo, não mais
carismático que os símios, porém persistente, composto principalmente pelos
personagens de Gary Oldman e Jason Clarke. Oldman interpreta o líder do clã dos
humanos, cuja relação com o vírus é deveras marcante para o seu personagem;
apesar de um papel pequeno, o ator consegue desempenhar bem seu trabalho,
principalmente nos momentos finais, quando o público vê um Gary Oldman dando o
melhor de si, ainda que de forma breve. Clarke faz o típico papel do homem
enviado pelos humanos para tentar comunicar-se com a outra espécie, personagens
que quase sempre vemos em filmes de ficção científica; este, porém,
diferencia-se dos demais justamente devida os laços que são criados entre
Malcoln (personagem de Clarke) e Cesar, que consegue ser bem mais interessante
que a relação do protagonista primata com James Franco, no primeiro filme. Vale
lembrar que o tom melancólico presente no filme, devido a confiança de Malcon
em Cesar e vice-versa, resulta em um pequeno, porém grandioso diálogo ao final
do longa, a respeito da necessidade de haver finalmente uma guerra.
Se em Cloverfield – Monstro Matt Reeves
conseguiu surpreender o público, pode apostar que todo o talento do diretor em
ficção-científica se repete e com aprimoramentos. Outro grande ponto positivo
em Planeta dos Macacos – O Confronto é a direção de arte, cuja construção dos
cenários pós-apocalípticos e da fortaleza dos macacos, se aproximando do visual
rústico dos filmes antigos da série. A fotografia também é bela, principalmente
nas cenas noturnas, como as do primeiro ataque dos macacos contra os humanos,
onde a iluminação vem do fogo. Infelizmente, a trilha sonora de Michael Giacchino,
um dos atuais mestres das trilhas de cinema, deixou a desejar; Giacchino
poderia ter incluído elementos da clássica trilha do filme de 1968, misturados
com seu talento original, para dar mais “alma” à atmosfera apocalíptica do novo
longa-metragem.
Muitos podem considerar a Planeta dos Macacos
– O Confronto apenas um filme introdutivo, assim como o primeiro, do que ainda
está por vir, sendo realmente esta a proposta do longa de Matt Reeves. Como já
falei, o filme abre extensas portas para novas explorações em futuras
sequências, que, com certeza, serão lançadas daqui a poucos anos. Em conclusão,
posso afirmar, sem exageros, que Reeves presenteou os fãs da série Planeta dos
Macacos com outro grande prelúdio que nos deixa com gostinho de “quero mais”,
pois, segundo Cesar, “a guerra começou!”.
Planeta dos Macacos - O Confronto (Dawn of the Planet of the Apes)
Direção: Matt Reeves
Produção: Peter Chernin, Dylan Clark, Rick Jaffa e Amanda Silver
Roteiro: Rick Jaffa,
Amanda Silver, Scott Z. Burns e Mark Bomback (Baseado em “La planète des
singes“ de Pierre Boulle)
Trilha Sonora: Michael
Giacchino
Elenco: Andy
Serkis, Gary Oldman, Jason Clarke, Kodi Smit-McPhee, Keri Russell, Judy Greer, Toby
Kebbell, entre outros.
EUA, 2014 - 2h 10 minutos
Nota: 8,5