quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Fotografias

    Era mais uma madrugada quente de verão que tirava o sono do velho Arquimedes. O idoso, de mais ou menos 80 anos, não conseguia dormir devido ao intenso calor do o mês de janeiro. Arquimedes era um velhinho viúvo que não dependia da ajuda dos outros, pois sabia muito bem como se virar sozinho. Apesar das advertências, ainda dirigia seu carrinho, passeava sozinho e não deixava absolutamente ninguém pegar suas compras, nem mesmo seus filhos que sempre se ofereciam para ajudar. Talvez, o ancião preferisse viver os poucos dias que ainda lhe restavam só

   Em mais uma infortuna madrugada de insônia, o senhor Arquimedes resolveu andar pela casa na qual morava sozinho, desde o falecimento de sua esposa, há 2 anos. Quando não mais quis andar, sentou-se no sofá e ligou a televisão para assistir alguma coisa que lhe desse sono, porém nem isso o faria dormir. Entediado, com calor e chateado com aquela madrugada infeliz que não terminava, o velho então fez algo que nunca gostara de fazer: pegou no armário do corredor uma pesada maleta que continha diversos álbuns de fotografias antigas.

   Arquimedes nunca foi uma pessoal sentimental, nem mesmo com a velhice. Jamais reparara em fotos, pois pouco gostava de recordações de seu passado. Talvez, olhar fotografias antigas lhe traria sono. O velho homem então pegou um álbum empoeirado e começou a olhar algumas fotografias. Eram imagens que mostravam sua infância, seus velhos tempos de menino; haviam fotografias em que Arquimedes estava acompanhado dos primos e coleguinhas da rua em que morava. Retirando outro álbum da maleta, o ancião reparou fotos extremamente antigas onde estava sozinho em imagens muito antigas e mal cuidadas que lhe mostravam quando ainda era um bebê. Arquimedes, ao olhar suas fotos sem companhia, notou uma mancha estranha em uma delas, era algo parecido com a sombra, ou até mesmo o corpo de um homem encapuzado, mas aquilo poderia ser um defeito da máquina fotográfica ou desgaste da imagem que já tinha uma longa idade. Ao olhar atentamente para outras fotos, o idoso deparou-se com o mesmo suposto defeito: a tal figura encapuzada muito escura e até mesmo um pouco perturbadora. Em cada foto sua que via, aquele ser de capuz estava lá! Em uma das imagens, Arquimedes jurou ter visto seus olhos. O velho começou a char aquilo estranho.

    Arquimedes não estava assustado, ainda. O velho somente não conseguia entender o que era aquilo, o motivo de nunca tê-lo visto anteriormente e razão pela qual a imagem aparecia somente nas fotos em que estava desacompanhado. Resolveu então pegar outro álbum, vasculhou suas fotos e viu a mesma sombra perturbadora. Arquimedes não havia ainda reparado nas suas fotografias que enfeitavam a sala de estar e estas, como eram recentes e sempre olhava (mesmo sem querer) quando passava de uma sala para outra, provavelmente não estavam com a presença de uma figura “fantasmagórica”. Para comprovar isso, o velho Arquimedes soltou de sua poltrona e foi direto para o local ondem as imagens estavam enfeitando. Chegando lá, de imediato percebeu que estava enganado. O idoso começou a ficar assustado quando viu a imagem muita mais nítida, com semblante misterioso e, talvez, assassino. Notou também a figura muito mais próxima de sua pessoa, o que o deixou apavorado.


   A maldita curiosidade humana não impediu Arquimedes de cometer o maior erro de sua vida. O velho possuía em casa uma câmera digital que quase não usava e decidiu tirar uma fotografia sua para comprovar se aquilo estava realmente acontecendo, Arquimedes sempre fora uma pessoa bastante cética. Ele precisava ter certeza se aquilo não era loucura e em algum lugar de sua mente de quase 80 anos, velha e com alguns problemas, dizia que tirar uma fotografia de si próprio seria a solução. O velho então ligou a pequena câmera foi para o quarto tentar tirar um retrato no espelho, para melhor aparecer sua pessoa.

    Posicionando a câmera da maneira como queria, o idoso bateu uma foto sua e, depois, foi conferir o resultado. Não havia anormalidades na imagem, nenhuma figura encapuzada ou algo parecido estavam presentes na fotografia. O velho então teve consciência de que não havia nada também em suas fotos antigas, que tudo aquilo poderia ser sua mente envelhecida lhe pregando peças ou até mesmo sono, embora ainda não estivesse com vontade de ir para a cama. Arquimedes ainda estava de frente para o espelho e quando se virou para conferir novamente as outras fotos antigas deparou-se com uma figura cuja imagem não estava refletida no espelho. O homem de capuz estava bem a sua frente, seu sorriso malicioso era visível, assim como seus olhos inchados e mortos. O grito de horror do senhor Arquimedes teria saído se a faca do encapuzado não tivesse lhe cortado a garganta e perfurado o crânio, tirando-lhe a oportunidade de pedir socorro pela vida que já não existia mais.

     Abandonando o corpo do velho Arquimedes no local de seu assassinato e colocando a faca do crime em suas mãos mortas (os vizinhos acreditariam na possibilidade de suicídio de um velho solitário e ranzinza), o encapuzado simplesmente desapareceu. A casa ficou silenciosa, assim como o resto da vizinhança que não costumava madrugar. Arquimedes havia deixado todas as fotografias antigas bagunçadas sobre a mesa da sala de jantar, inclusive uma que mostrava seu filho mais velho recém-nascido desacompanhado, sentado no carrinho de bebê e ao lado uma manchinha preta que mais parecia um homem de capuz.

Um comentário: