O rapaz, então,
resolveu não contar nada daquilo para os seus familiares, pois não sabia como
interpretariam. Era, de fato, um fato impossível de ser contado à alguém, assim
como muito difícil de engolir. “O que fazer?” pensava Michael. “O que Henry
faria?”. Provavelmente, se houvesse acontecido o inverso, seu irmão iria atrás
da sereia e teria sua vingança. Sendo aquela uma atitude adequada ou não, era
justamente o que Michael iria fazer também.
O garoto vestiu roupas de frio, pegou um arpão e outros objetos
cortantes, uma lanterna de vela para iluminar e, depois de muito tempo, saiu do
seu quarto para encarar o mundo, ou o mar. Chegando ao ancoradouro da mansão,
Michael desacorrentou seu barco e partiu para caçar a criatura que havia
destruído sua família. Não sabia ao certo se teria sucesso, tampouco se iria encontrá-la,
mas, para ele, aquela era uma oportunidade única. Não podia deixar de fazer
aquilo, naquela madrugada de Lua cheia.
A maré estava muito
alta, logo Michael sentiu estar navegando em alto mar no seu pequeno, mas
resistente, barco. O brilho lunar embelezava as águas marinhas, dando um tom
azulado à escuridão e, apesar de estar vivendo um momento tenso, Michael não
deixou de admirar o belo ambiente em que estava. Ao ouvir um estranho barulho,
o garoto preparou um dos arpões e esperou algum movimento. Como a família era
dona de uma das maiores companhias de pesca da Inglaterra, tanto no depósito da
mansão como no ancoradouro havia objetos para pegar peixe de sobra.
Quando escutou um segundo barulho, vindo de trás, Michael
tomou um leve susto, mas, mesmo assim, inclinou-se um pouco para fora do barco
para conferir o que era. Temia que fosse um tubarão, a força do bicho
destruiria sua embarcação, porém logo viu uma espécie de barbatana verde
brilhando debaixo d’água. Logo, teve certeza de que a sereia assassina estava
lá. Antes de preparar o arpão para jogá-lo, a sereia, mais rápida, saltou pra
fora do mar, atingindo o barco com as mãos, quase fazendo virar. Michael estava
segurando firme, mas a criatura parecia irritada; estava cada vez mais
balançando o barco e gritando enquanto o fazia. Houve um momento em que a
criatura conseguiu subir no barco e, com um forte ataque com os braços, tirar a
arma das mãos de Michael e cortar seu peito com as garras. O garoto não caiu,
apesar de tanta dor, mas conseguiu reagir e recuperar o arpão, perfurando a
cauda da criatura e prendendo-a em um dos bancos de madeira da embarcação.
A sereia gritava,
gemia um desesperado grito de dor. O rapaz encarou a criatura por um tempo, não
acreditando como uma coisa tão bela pudesse ser tão maligna. O coração juvenil
e inocente de Michael amoleceu quando percebeu lágrimas caírem dos olhos,
verdes como o oceano, da sereia; teve pena da dor que a criatura sentia, e isso
o fazia sentir ódio mais ainda de si, pois não era prudente sentir algo, a não
ser raiva, da coisa que matou seu irmão. Michael, então, sentiu que não conseguiria
matá-la. Odiaria admitir aquilo, mas, tal criatura, ainda lhe encantava. Quando
o rapaz tirou cuidadosamente o arpão da cauda da garota, que ainda sangrava um
líquido preto, esta retribuiu, agarrando-se em seus braços e lhe dando um
beijo, o primeiro beijo que Michael recebera na vida e, também, o último.
O rapaz sentiu os
afiados dentes da sereia entrando em seus lábios, jorrando rios de sangue, e,
em seguida, toda sua face ser arrancada pela brutal força das unhas e dentes da
criatura. A sereia, então, jogou o corpo de Michael para fora do barco e o
arrastou para as profundezas do oceano, onde jamais nenhuma criatura humana
encontraria seus vestígios.
Fim.
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