segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Outro Conto Sobre Sereias e Mortes (Parte II)

  Então, após o incidente, Michael percebeu a verdade por trás da suposta loucura de seu irmão. Henry havia sido enfeitiçado pelos encantos da sereia e aquilo causara sua morte. A loucura da qual o garoto fora diagnosticado era resultante daquela maldita e assassina criatura do mar. Michael não sabia o que fazer, apenas sentia um ódio mortal daquele monstro e de si mesmo, por quase deixa-la acabar com sua vida também.

  O rapaz, então, resolveu não contar nada daquilo para os seus familiares, pois não sabia como interpretariam. Era, de fato, um fato impossível de ser contado à alguém, assim como muito difícil de engolir. “O que fazer?” pensava Michael. “O que Henry faria?”. Provavelmente, se houvesse acontecido o inverso, seu irmão iria atrás da sereia e teria sua vingança. Sendo aquela uma atitude adequada ou não, era justamente o que Michael iria fazer também.  O garoto vestiu roupas de frio, pegou um arpão e outros objetos cortantes, uma lanterna de vela para iluminar e, depois de muito tempo, saiu do seu quarto para encarar o mundo, ou o mar. Chegando ao ancoradouro da mansão, Michael desacorrentou seu barco e partiu para caçar a criatura que havia destruído sua família. Não sabia ao certo se teria sucesso, tampouco se iria encontrá-la, mas, para ele, aquela era uma oportunidade única. Não podia deixar de fazer aquilo, naquela madrugada de Lua cheia.

 A maré estava muito alta, logo Michael sentiu estar navegando em alto mar no seu pequeno, mas resistente, barco. O brilho lunar embelezava as águas marinhas, dando um tom azulado à escuridão e, apesar de estar vivendo um momento tenso, Michael não deixou de admirar o belo ambiente em que estava. Ao ouvir um estranho barulho, o garoto preparou um dos arpões e esperou algum movimento. Como a família era dona de uma das maiores companhias de pesca da Inglaterra, tanto no depósito da mansão como no ancoradouro havia objetos para pegar peixe de sobra. 

  Quando escutou um segundo barulho, vindo de trás, Michael tomou um leve susto, mas, mesmo assim, inclinou-se um pouco para fora do barco para conferir o que era. Temia que fosse um tubarão, a força do bicho destruiria sua embarcação, porém logo viu uma espécie de barbatana verde brilhando debaixo d’água. Logo, teve certeza de que a sereia assassina estava lá. Antes de preparar o arpão para jogá-lo, a sereia, mais rápida, saltou pra fora do mar, atingindo o barco com as mãos, quase fazendo virar. Michael estava segurando firme, mas a criatura parecia irritada; estava cada vez mais balançando o barco e gritando enquanto o fazia. Houve um momento em que a criatura conseguiu subir no barco e, com um forte ataque com os braços, tirar a arma das mãos de Michael e cortar seu peito com as garras. O garoto não caiu, apesar de tanta dor, mas conseguiu reagir e recuperar o arpão, perfurando a cauda da criatura e prendendo-a em um dos bancos de madeira da embarcação.

  A sereia gritava, gemia um desesperado grito de dor. O rapaz encarou a criatura por um tempo, não acreditando como uma coisa tão bela pudesse ser tão maligna. O coração juvenil e inocente de Michael amoleceu quando percebeu lágrimas caírem dos olhos, verdes como o oceano, da sereia; teve pena da dor que a criatura sentia, e isso o fazia sentir ódio mais ainda de si, pois não era prudente sentir algo, a não ser raiva, da coisa que matou seu irmão. Michael, então, sentiu que não conseguiria matá-la. Odiaria admitir aquilo, mas, tal criatura, ainda lhe encantava. Quando o rapaz tirou cuidadosamente o arpão da cauda da garota, que ainda sangrava um líquido preto, esta retribuiu, agarrando-se em seus braços e lhe dando um beijo, o primeiro beijo que Michael recebera na vida e, também, o último.

  O rapaz sentiu os afiados dentes da sereia entrando em seus lábios, jorrando rios de sangue, e, em seguida, toda sua face ser arrancada pela brutal força das unhas e dentes da criatura. A sereia, então, jogou o corpo de Michael para fora do barco e o arrastou para as profundezas do oceano, onde jamais nenhuma criatura humana encontraria seus vestígios. 


Fim.



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