quinta-feira, 19 de junho de 2014

Conto: O outro lado

 Ernest acordou com um impulso ocasionado por um sonho. Não um sonho qualquer, mas aqueles em que a pessoa está tranquilamente caminhando e, sem mais nem menos, cai de uma altura relativamente alta fazendo-a acordar no momento exato em que seu corpo encontra-se com o solo, ocasionando, assim, a morte seguida do despertar.

  Ainda assustado com o pesadelo mortal, o rapaz, ainda sentado na poltrona em frente à lareira na sala de estar da sua residência, sentiu um repentino e desconfortável calor tomar conta de seu corpo; uma sensação realmente quente, como se naquela poltrona, onde se encontrava sentado, existisse alguma coisa que estivesse liberando tal calor. Apesar do abafado que sentia dentro de si, Ernest não suava, tampouco sentiu a pela quente quando tocou as próprias mãos. Ao se levantar, percebeu uma leve melhora térmica, porém, o ambiente ao seu redor ainda não lhe parecia confortável.

 A sala de estar estava em completa escuridão, e Ernest não lembrava-se de ter apagado todas as luzes antes de cochilar na poltrona; nem mesmo recordava de como havia chegado lá e o que fizera antes de dormir. Confuso e sem saber no que pensar, o rapaz virou-se para trás para observar se a luz da cozinha estava acesa e, ao fazer, deparou-se com uma estranha sombra no exato local onde estava sentado há poucos minutos. Ao observar aquela estranha figura negra, Ernest deu um salto para trás e quase emitiu um grito devido ao susto que tivera. Pensou que aquela sombra estivesse envolvida com o calor que sentiu quando despertou do sono. Como se aquilo não bastasse, o rapaz, ainda com os olhos vidrados na figura que lhe atormentava, percebeu um forte feixe de luz, vindo da sua direita.

  Ainda sentado no chão, sem nada em mente que explicasse aqueles acontecimentos, Ernest procurou se levantar para acender as luzes e, assim que percebeu mais dois flashs de luz extremamente fortes, seguidos de ruídos e estranhas vozes, tomou cada vez mais forças para correr e procurar o interruptor mais próximo e quando finalmente encontrou o que acendia as luzes da sala de estar, clicou. Enfim, o ambiente tornou-se claro, o que, para Ernest, já era um alívio. De repente, inúmeros feixes de luz, parecidos com os 3 anteriores, vieram em sua direção, como um enxame de abelhas que ataca alguém que rouba o mel. A claridade e o som que se propagava nas paredes fechadas do local tornavam-se infernais, deixando Ernest em total desespero. Os últimos flashs foram tão violentos que fizeram o garoto cair para trás, fazendo derrubar objetos que enfeitavam uma estante que quase fora também derrubada com a força do corpo de Ernest. O rapaz sentiu vontade de chorar, mas nenhuma lágrima lhe escorreu dos olhos.

 Sentado ao chão, esperando que o pior pudesse acontecer a qualquer momento, Ernest percebeu que ao lado havia um porta-retratos caído. O garoto decidiu pegar para ver que foto lá havia, mas não estava conseguindo encostar os dedos no objeto. De tão desnorteado que se encontrava o rapaz, não percebeu ele que sua mão estava praticamente atravessando o porta-retratos. Ainda sem entender o que estava acontecendo com suas mãos, Ernest tentou novamente pegar o objeto, até finalmente conseguir. Só foi o tempo de observar brevemente a imagem de um casal com um jovem recém-formado em uma Universidade de Artes Cênicas, até o porta-retratos atravessar sua mão e cair. O rapaz, então, percebeu que conhecia aquelas pessoas da foto, principalmente o adolescente que entraria para a faculdade, mas não se lembrava de onde. Foi então que Ernest se perguntou o que aquela imagem estava fazendo na sua casa, que lugar era aquele em que estava (apesar de ter certeza absoluta de que era sua residência), o que aconteceu antes de ele ter ido cochilar na poltrona da sala de estar e, principalmente, o que eram aqueles fenômenos paranormais que estavam acontecendo na casa e, agora, com sua pessoa. Ao lado da estante que o garoto quase derrubara, havia um espelho, onde Ernest, ao tentar se levantar, deparou-se com imagens que não estavam presentes no local onde se encontrava. O espelho não mostrava seu rosto, e sim a casa e pessoas que não estavam presentes naquele momento.

  Ernest pôde ver dois jovens com duas câmeras profissionais nas mãos e seus demais equipamentos de fotografia, um homem barbudo de óculos, sentado em sua poltrona, mexendo em estranhos equipamentos de som e um notebook, uma senhora já idosa sentada à mesa de jantar com os mais peculiares materiais, como: termômetros, gravadores, câmeras que pareciam infravermelhas, entre outros. Por último, Ernest notou que, também sentados à mesa de jantar, estava o casal que vira na fotografia, mas sem o filho. O homem e a mulher, ambos com semblante de tristeza no rosto, o que deixou Ernest um tanto angustiado, conversavam com a senhora idosa. Não ousando olhar para trás, até pelo fato de agora ver apenas uma neblina branca tomar conta da sala, o rapaz, sem dar importância ao novo fenômeno, aproximou-se do espelho para tentar ouvir o que era refletido.

- Sim, ele está aqui entre nós. – Disse a velhinha. – Ele sempre esteve nessa casa, desde o momento de sua partida.

 O casal começara a chorar. A senhora acariciou as mãos do homem e da mulher, a fim de consolá-los, até o homem barbudo entrar na conversa:

- Acredito que o filho de vocês sempre teve uma forte ligação com a casa. Creio eu ele ter nascido aqui, certo?

- Sim. – Respondeu a mulher.

- E também faleceu aqui. – Afirmou o barbudo de óculos. – Espíritos como o dele tendem à passar um tempo nos lugares que marcaram sua, ou, até mesmo, para o local de sua morte. Por essa razão, acredito que todos os hospitais do mundo são assombrados. - Completou rindo, como se tivesse contado uma piada sem graça.

 Ao perceber o olhar de desaprovação da velhinha, o barbudo completou:

- Bem, o filho de vocês, como nasceu e morreu, além, claro, de ter passado grande parte de sua vida aqui, assombrará essa residência por um longo tempo, até encontrar o caminho para o outro lado.

- Está me dizendo, então, que o espírito de Ernest não encontrou a paz? – Perguntou o homem, abraçado a sua esposa.

- Exatamente. – Concluiu o pesquisador barbudo. – O confesso que senti, até demais, a presença dele, quando passei a me sentar em sua poltrona. Ele também estava lá, pois senti como se meu corpo estivesse congelando.

- Então, os objetos caídos, a luz se acendendo sozinha e tudo mais, foram obras dele? – Perguntou a mãe de Ernest. – Não há mais ninguém, nenhum outro espírito.

- Sempre há espíritos, senhora. Porém, aqueles que não encontram o caminho para o além da vida, permanecem aqui. Seu filho é o único espírito perdido dessa casa. Só espero que um dia ele consiga encontrar a paz. Pois bem, querem que eu mostre os registros fotográficos?

- Sim, queremos ver. – Respondeu o pai.

- Me acompanhem, então.

 Com o que havia visto através do espelho, Ernest tornou a lembrar-se o que lhe havia acontecido, como a corda lhe havia apertado fortemente o pescoço e o sufocado até a morte, quando a vida no mundo das artes subiu-lhe a cabeça da pior maneira. Lembrava-se, então, que aquele jovem rapaz recém formando da foto não teria um destino feliz, muito menos um final digno ou natural, como as coisas devem ser. O rapaz voltou a ter consciência de que uma alma perdida, como a sua, tende a não lembrar suas condições atuais ou nem mesmo aceita a própria morte.

 Ao deixar de olhar o que acontecia no mundo dos vivos pelo espelho, o rapaz virou-se de costas e percebeu a névoa que havia tomado conta do ambiente desaparecido. Estava Ernest agora na sala de estar de sua casa, observando os experimentos paranormais que aconteciam no local, a fim de de obter contato com seu espírito; o garoto podia ver todos que estavam sendo refletidos no espelho, agora a sua frente: a idosa espírita, os dois rapazes dos equipamentos de imagem e som e o cientista barbudo que estava mostrando alguns registros feitos durante a atividade para os seus pais. Obviamente, nenhuma dessas pessoas poderia vê-lo, mas senti-lo se seu espírito atingisse um estado de fúria.

 Tudo que a pobre alma de Ernest sentia, porém, não era mais incerteza ou perdição, mas nada além de arrependimento. Arrependimento de ter sido tão egoísta a ponto de romper com a naturalidade da vida e abandonar pessoas que lhe amavam, fazendo-as sofrer uma dor maior da que seu corpo sentiu ao entrar em óbito. Ao ser aproximar de seus pais, enquanto estes observavam as fotografias capturadas durante a sessão, que mostravam nevoeiros ora esbranquiçados, ora negros, Ernest percebeu o quanto eles observavam tristemente, sem um pingo de medo ou desconforto, os registros. Mais uma vez, o rapaz sentiu o incomodante calor vivo e resolveu se afastar, pois a frieza de seu espírito o denunciaria. Resolveu, então, não fazer mais nada além de vagar na sua prisão, já que a vida eterna por ele não fora concedida e estava bem distante do garoto encontrar.

  Ernest também lembrou de que seu maior terror não era esquecer de que estava morto e logo depois voltar a ser lembrar; até mesmo presenciar experiências estranhas causadas pelos vivos estava longe de ser sua maior aflição; mas o que lhe feria os sentimentos, que, mesmo após a morte, ainda era capaz de sentir, era observar todos os dias seu pai e sua mãe derramarem lágrimas por sua causa.

- O que foi que eu fiz?! – Disse Ernest, levando as mãos ao rosto.  

quarta-feira, 18 de junho de 2014

HQ de Quentin Tarantino reunirá Django e Zorro

 Após o sucesso de público e crítica do filme Django Livre (Django Unchained), o primeiro faroeste de Quentin Tarantino, o diretor decidiu retornar ao universo da personagem numa série de quadrinhos com a participação de ninguém menos que Zorro.

 Intitulada Django/Zorro, a HQ continuará com o a história do filme de Tarantino com um crossover com o herói mascarado do povão criado por Johnston McCulleym sendo escrita pelo cineasta em parceria com Matt Wagner, que já escreveu diversas histórias em quadrinhos de Zorro. "Foi depois de ler seu trabalho em Zorro que me convenci de que seria uma boa ideia unir estes dois ícones", afirmou Tarantino, em entrevista. Wagner ficará responsável também pelo roteiro final.

 A HQ será publicada pela Dynamite Entertaniment e pela DC Comics, que já lançou uma adaptação do longa-metragem Django Livre para os quadrinhos em 2013. A previsão de lançamento de Django/Zorro é para o segundo semestre deste ano.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Planeta dos Macacos 2 - O Confronto - Trailer, comerciais e cartazes

  O Planeta dos Macacos 2 - O Confronto (Dawn of the Planet of the Apes), continuação do filme O Planeta dos Macacos - A Origem, de 2011, promete ser um dos longas-metragens grandiosos de 2014.

 Dirigido por Matt Reeves (Cloverfield - Monstro), a história do novo filme se passa anos após os acontecimentos do primeiro e acompanha César (Andy Serkis), líder da nação cada vez mais crescente de macacos geneticamente evoluídos, e um grupo de humanos sobreviventes da devastação virótica. Embora macacos e humanos tenham estabelecido uma trégua, a paz não vai durar por muito tempo. O filme também conta com Gary Oldman, Jason Clarke, Judy Greer, Keri Russell, Kodi Smit-McPhee, Toby Kebbell e Enrique Murciano.

Confira o trailer completo do longa e dois comerciais, abaixo:

Trailer:



TV Spots




Veja também cartazes do filme:


Planeta dos Macados 2 poster 05jun2014 01


Planeta dos Macacos 2 poster 05Jun2014 02


O Planeta dos Macacos 2 - O Confronto estreia em 24 de julho, no Brasil.



sábado, 7 de junho de 2014

Malévola: Crírica

 Malévola sempre foi uma das vilãs (ou, talvez A Vilã) mais respeitadas, temidas e veneradas da Disney. Uma personagem macabra, de rosto angelical, cornos de demônio e uma maldade incondicional são marcas registradas da icônica antagonista de A Bela Adormecida. O Clássico-Disney de 1959 inovou ao mostrar pela primeira vez uma vilã carismática que fosse aceita pelo público e que definitivamente roubasse a cena, deixando a protagonista e os coadjuvantes no chinelo.

 Nada mais justo que a tão venerada vilã ganhasse um longa-metragem próprio, onde contasse suas origens e sua história ao redor do conto da Princesa Aurora. O filme, Malévola (Maleficent), mostra exatamente isso: como a personagem tornou-se a antagonista que todos conhecemos e sua visão a respeito da história da Bela Adormecida. Tal proposta já virou “mania” dos estúdios Disney; como podemos observar em filmes do mesmo estilo, como o aceitável Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton, e o esquecível Oz: Mágico e Poderoso, de Sam Raimi. Ao contrário do que muitos pensam, não acho que tais filmes sejam realizados para arrecadar lucro ao estúdio e envergonhar os clássicos. Apesar de não ter apreciado a versão do Raimi de o Mágico de Oz, compreendo que a intenção do diretor era fazer uma espécie de prelúdio misturando elementos da obra clássica com novos; Tim Burton fez, mais ou menos, a mesma coisa em Alice, quando resolveu contar a história após os acontecimentos ocorridos no livro de Lewis Carroll e na animação de 1951. Ambos os longas, com boas propostas, pecam pela falta de desenvolvimento e responsabilidade de seus realizadores para com a clássica obra que estão mexendo. O mesmo erro por trás de um grande acerto se encontra em Malévola, infelizmente. Digo “infelizmente”, pois eu realmente esperava muito mais de um filme que prometia ser um dos melhores da temporada, até pela repercussão lá fora e o sucesso que está garantindo. Não que o longa seja ruim, pelo contrário, mas ressaltarei aqui os verdadeiros motivos que explicarão tal “infelizmente”.

 Como já fora dito, o filme mostra a história não contada da famosa vilã da Disney, da sua feliz infância, em um reino encantado longe dos humanos, que tinham uma rixa com os habitantes de tal lugar, até um determinado acontecimento em sua vida envolvendo a ilusão do “amor verdadeiro”, o que torna Malévola a personagem que todos conhecemos. Assim, Malévola, que de fada passou a ser uma bruxa, para se vingar de tal acontecimento que tanto lhe atordoou no passado, roga uma maldição na princesa recém-nascida, Aurora, filha do homem que lhe partiu o coração e as asas (sim, Malévola tem asas!) antes de virar rei.

  O longa já começa bem, ao explorar a origem da personagem e o porquê de sua perversidade, além de, por se tratar de uma versão modificada da história conhecida, mostrar como um personagem que ninguém dava importância fora essencial para o desenrolar da trama, o futuro Rei Stefan. De fato, a relação entre Stefan e Malévola é bem explorada no começo, o que merecia ter mais destaque no meio para o fim do filme e usado como elemento para intensificar a maldade da personagem principal, o que boa parte do público com certeza esperava, mas, infelizmente, não aconteceu. A Disney preferiu explorar um lado mais “humano”, ou até mesmo bondoso, de Malévola, quando chega o segundo ato do longa-metragem que mostra a vilã praticamente cuidando da Princesa Aurora quando esta é mandada pelo Rei para as 3 fadas que iriam protegê-la; sendo as fadinhas inexperientes (e até mesmo irritantes, estando mais voltadas para uma versão sem graça dos Três Patetas) em matéria de cuidar de crianças, foi Malévola que, secretamente e com ajuda de seu corvo, Diaval, tornou-se a “Fada Madrinha” da Princesa, a fim de esta alcançasse os 16 anos e a maldição se concretizasse. Porém, Aurora, já aos 16 anos, descobre sua “Fada Madrinha”, passando, assim, a venerar Malévola e a media que a vilã convive com a princesa que tanto odiava, descobre que talvez fosse ela a chave para a sua felicidade e para a paz no reino em que vivia, afastado dos humanos. É a partir da escolha pouco inteligente de explorar a relação entre Malévola e Aurora, em vez da vilã e Stefan (o que arrecadaria, com certeza, mais momentos de ódio, tristeza e motivos para que a personagem tornar-se cada vez mais perigosa), que o filme passa a se desenvolver. Novamente, o estúdio usa a ideia de criar uma personagem feminina forte, assim como vimos em “Valente” e “Frozen”, que demostram uma nova, porém verdadeira, prova de amor, o que quebra o clichê do “beijo do amor verdadeiro” para dar um final feliz à história.

  Tal prova de amor verdadeiro entre duas mulheres se repete em Malévola, o que faz parecer que a Disney está utilizando a quebra de clichê para criar um novo. Porém, sendo esta proposta nova, ainda pode ser usada em muitos filmes, mas não em todos. Há limites que, para o bem da qualidade dos futuros longas do estúdios (mesmo que esses arrecadam milhões em bilheteria), devem ser respeitados. Malévola podia ter sido um filme diferente dos demais e tinha tudo para ser, mas, justamente por causa da nova ideia do estúdio (que funcionou tão bem nas duas animações antes mencionadas), acabou se perdendo na mesmice do “Padrão Disney”. No início do texto, mencionei que Malévola sempre fora uma das vilãs mais temidas e veneradas das animações clássicas, e era justamente isso que o público que tem “A Bela Adormecida” como um marco na infância espera da personagem no filme de 2014. Claro que, por ser uma versão modificada da história original, a bruxa teria de ser diferente, mas tal mudança fora tão drástica e desnecessária que acabou sendo o maior erro do novo longa-metragem. Já passou da hora da Disney deixar de lado a temática “felizes para sempre”, em filmes live-action, até pelo fato destes não serem direcionados ao público infantil. Não só eu como muita gente esperava ver um filme totalmente da personagem do mal, onde seus atos prevaleceriam até o final, o que daria o filme o privilégio de mostrar algo novo: um vilão finalmente vencendo; apesar de em Malévola a personagem principal “vencer”, de certa forma.

  A partir da análise do último parágrafo, já se pode notar que a Malévola do longa-metragem de Robert Stromberg é totalmente diferente da vilã da animação de 1959. Portanto, nada de bruxa maligna, com frases de efeito, risada maléfica, entre outras das diversas qualidades da icônica personagem do filme de Clyde Geronimi na Malévola da Angelina Jolie. Ei, mas isso não é uma crítica negativa contra a diviníssima atriz! Jolie, apesar de pouco apresentar da personagem clássica, a não ser pela aparência física (ressalto logo que a caracterização de Angelina está formidável), consegue criar uma Malévola própria, isto é, dar uma nova vida a uma personagem imortal, por assim dizer. Sim, a infidelidade “espiritual” de Malévola incomoda a quem venera a vilã do desenho animado (incomodou a mim), mas, não se pode negar que Angelina cumpriu o que havia prometido nos trailers e demais divulgações do filme: roubar definitivamente a cena, da melhor, à pior (que, por ela estar presente, tenta não parecer tão ruim). Talvez, o único personagem que também consegue agradar e ser bem explorado é o Rei Stefan, interpretado pelo ótimo ator sul-africano Sharlto Copley (Distrito 9, Elysium) que consegue interpretar sem dificuldades um governante enlouquecido pela obsessão de se livrar da bruxa que rogou uma praga na sua filha. Falando nela, a atriz Elle Fanning é, de fato, bela, mas parece adormecida em todo o filme; “adormecida” no sentido de fazer absolutamente nada, somente achar tudo lindo e maravilhoso e servir de desculpa para a tal rendição de Malévola. Outras personagens que, infelizmente, não me fizeram engolir e que podiam ser muito bem descartadas do filme são as fadas Flittle, Knotgrass e Thistletwit, interpretadas respectivamente por Lesley Manville, Imelda Staunton e Juno Temple, cujas cenas de comédia pastelão podiam ter sido muito bem trocadas por elementos que completassem a história e não atrapalhassem. Como se não bastasse o mau uso das fadinhas, que são praticamente as personagens principais na animação de 1959, surge o Príncipe Phillip (Brenton Thwaites), que foi usado para servir como desculpa para que o clichê do “beijo do amor verdadeiro” não acontecesse; a cena desta passagem é cômica e até bem bolada, mas usar um dos personagens, do filme clássico, mais importantes somente para isso, além da falta de carisma de Thwaites, não convence.

  Robert Stromberg marcou em Malévola sua estreia como diretor. O cineasta fora responsável pelos efeitos visuais de longas-metragens visualmente lindos, como Avatar, de James Cameron, Alice no País das Maravilhas (Burton), Oz: Mágico e Poderoso (Raimi), entre outros. Claro que seu primeiro projeto na direção não sairia revestido em ouro, até pelo fato de o diretor não ser o único responsável pelas escorregadas do filme, pois a culpa disso também deve ser atribuída ao roteiro rápido e pouco empolgante de Linda Woolverton, que já trabalhou em animações consagradas da Disney: A Bela e a Fera e O Rei Leão. O que livra o filme do eterno perigo é, além das Atuações de Angelina Jolie e Sharlto Copley, é a sua técnica. O que mais me chamou atenção, além dos belos efeitos-visuais, foi a fotografia de Dean Semler, que consegue explorar e distribuir com maestria os visuais sombrios e claros a determinados momentos do longa.  Outros importantes pontos dos recursos técnicos de Malévola são a maquiagem e o figurino, dignos para filmes do gênero, além da direção de arte exímia, que nem precisa de exaltados comentários, apenas apreciação.

  Porém, apesar da bela técnica e baseando-me no que falei antes, a pressa é, deveras, inimiga da perfeição. Malévola peca por alterar desnecessariamente pontos que dariam mais do que certo em uma versão live-action, em busca do rompimento com o antigo clichê existente na Disney, mas isso só fez o estúdio provar que tal quebra, que está sendo usada constantemente (pelo que vimos nos últimos filmes), pode tornar-se um novo e perigoso clichê. Portanto, se a Disney visasse realmente à qualidade de conteúdo de um filme, e não os montes de dinheiro arrecadados, saberia usar a nova temática de maneira correta, sem que esta começasse a chatear e distorcer verdadeiros clássicos. Só para deixar claro, nada tenho contra as novas versões criadas pelo estúdio, apenas não entendo como uma boa história ainda não foi (re)contada. 
 
Malévola (Maleficent)
Direção: Robert Stromberg
Produção: Joe Roth
Roteiro: Linda Woolverton, baseado em “A Bela Adormecida” (Walt Disney) e “La Belle au bois dormant” (Charles Perrault)
Trilha Sonora: James Newton Howard
Elenco: Angelina Jolie, Sharlto Copley, Elle Fanning, Imelda Staunton, Juno Temple, Lesley Manville, Sam Riley, Brenton Thwaites, entre outros.
EUA, 2014 – 1h 37 minutos
Nota: 6/10