sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Insanidades de Família (Parte I)

  A família Negromonte (o patriarca, a mãe e o casal de filhos adolescentes) pegou estrada logo de madrugada, rumo ao “paraíso de infância” do senhor Negromonte, chamado “Fazenda Nova”, uma pequena vila no interior pernambucano. ÀS 3 horas da madrugada daquele sábado, estavam todos no carro, sonolentos e mal humorados, exceto o pai. Saindo da cidade grande, pegaram a BR 232, muito mal iluminada e esburacada, como sempre. Apesar dos reveses, a estrada estava calma, com poucos movimentos, o que possibilitaria numa viagem rápida e sem preocupações.

   Dentro do carro, silêncio humano e som emitido pelo rádio do automóvel que tocava Beatles, para animar os dois filhos adolescentes que apreciavam o rock clássico. Após um tempo, os jovens e a mãe caíram no sono, deixando o pai sozinho no volante, conduzindo a velha Hilux 1995 da família. Por um momento, o senhor Negromonte percebeu que também sentia sono e não pôde perceber uma carreta, na sua faixa, vindo em sua direção. A pancada fora de raspão, porém forte o suficiente para fazer o carro capotar, deixando os passageiros feridos e desacordados. O motorista da carreta provavelmente estava embriagado e não parou para socorrer os Negromonte.

   O senhor e a senhora Negromonte acordaram quase no mesmo momento e perceberam que estavam em um quarto desconhecido, cheio de estantes e amontoados de livros e filmes, não parecia um quarto de uma casa típica de caipiras do agreste de Pernambuco. Quando o casal pôs-se de pé, perceberam que partes do corpo estavam enfaixados com curativos e, apesar de uma tontura, sentiam-se bem. Logo perceberam que os filhos não estavam lá e ficaram preocupados. De repente, um homem muito magro e de aparência jovem entrou no quarto com duas bandejas de comida. O senhor Negromonte, muito assustado e desconfiado, perguntou:

- Quem é você? Onde estão nossos filhos? Foi você quem nos socorreu?

O jovem magricela não sabia o que responder primeiro e foi logo falando:

- Fique calmo, meu senhor. Tá tudo bem, - Havia um sorriso engraçado em seu rosto fino. – Seus filhos estão no outro quarto e coloquei uns filmes para eles assistirem enquanto se recuperam. Eles estão ótimos, não sofreram muitos ferimentos, pois estavam mais relaxados na hora do impacto. Sinto ter que dizer isso, mas, sua caminhonete não está nada bem.

  O casal Negromonte ficou aliviado. Apresentaram-se para o rapaz que se chamava Tobias Meireles.

Após Tobias cuidar novamente de seus ferimentos e conversarem enquanto este fazia. O rapaz revelou ser estudante de medicina e fascinado por cinema e literatura. Depois, os pais foram de encontro aos filhos e desceram para tomar café da manhã, por cortesia de Tobias. A casa do rapaz ficava fora de qualquer cidadezinha do interior, era bastante grande e confortável. Eram quase 10 horas da manhã e começara a chover forte lá fora. A família Negromonte foi conduzida pelo anfitrião até a sala de jantar, onde havia uma mesa repleta de comida regional Todos se sentaram e comeram, exceto Tobias que apenas observava ainda com aquele sorriso um tanto idiota estampado na face.

- Não vai comer? – Perguntou o senhor Negromonte.

- Não, eu comi antes de achar vocês. – Respondeu Tobias
.
- Mas isso já faz muito tempo! Mais ou menos umas 5 horas. Tem certeza que não sente fome? – Perguntou a senhora Negromonte, sentindo-se um pouco preocupada.

  Tobias se acomodou melhor na cadeira e respondeu: 

- Eu tenho o costume de acordar de madrugada e comer logo após. Não durmo muito, quase não sinto sono.

   Por um momento, o garoto Negromonte achou aquilo meio estranho. Mas não acreditava que seu anfitrião seria uma má pessoa. A garota, por outro lado, não se sentia confortável perto daquele homem. Havia algo nele que a assustava ou, até mesmo, deixava encantada. Era um desconhecido, totalmente estranho, que havia salvado sua vida e de sua família.  Não sabia bem o que pensar dele.

  Ainda observando aquela família comer de sua comida, Tobias tentou puxar algum assunto:

- Está caindo uma tempestade, e vocês estão sem automóvel. Podem passar a noite aqui, tenho muitos quartos sobrando, roupas e comida. 

  Todos não gostaram muito da ideia, menos o senhor Negromonte que havia simpatizado-se com o rapaz.
- Adorariamos ficar, mas estamos indo para uma cidadezinha no interior, nos hospedar no antigo hotel dos meus pais. – Interveio a senhora Negromonte.

- Mas vocês não podem viajar sem carro. E não adianta ligar para o seguro ou reboque, ele está completamente destruído. E mesmo se não estivesse, teríamos que andar 10 km para o sul para pegar um bom sinal de celular. – Contra-atacou Tobias. 

  Fez-se silêncio por um instante, até que o garoto magricela voltou a falar:

- Sabem, nunca recebo pessoas aqui. Não tenho parentes vivos próximos, estou sozinho desde os meus 15 anos. Ficarei feliz em cuidar de vocês por hoje. Não creio que você conseguirá andar comigo até o local pra pegar um bom sinal ou para a locadora de carros com essa perna machucada, senhor Negromonte, ainda mais nessa chuva. Fiquem aqui, prometo que não irei incomodá-los. 

  As poucas palavras do jovem salvador daquela família de Recife pareceram comovê-los. Aceitaram ficar por um dia apenas, depois retomariam seu rumo. 

Continua...


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