No velório daquele
tão importante, amado, odiado ou até esquecido homem, havia parentes distantes,
amigos, colegas de trabalho, empregados e jornalistas. Entre os tantos
profissionais da área de jornalismo que estavam no local, destacava-se um jovem
que escrevia para o site do único jornal da cidade. Seu nome era Ernesto e era
um jovem repórter bastante competente e responsável. Andava pela Igreja (onde
acontecia o velório) e entrevistava rapidamente algumas pessoas que lá estavam.
Com um gravador na
mão e uma ideia fixa na cabeça, Ernesto andou em direção ao mordomo da mansão
do ex-prefeito morto, um homem baixinho, franzino e de cabelos brancos.
Perguntou-lhe a famosa charada: “tem alguma ideia de quem matou seu patrão?”.
O mordomo começou a
responder:
- Ele nunca foi um homem amigável, mas não tinha tantos
inimigos. Eu realmente nunca pensei que alguém faria isso com ele. Talvez,
tenha sido uma de suas antigas criadas, por vingança.
- Como assim? – Ernesto ficou bastante interessado.
- Há uns 20 anos, o senhor Feitosa teve uma relação com uma
das criadas, ocasionando o seu segundo e último divórcio. Meu patrão dormiu com
a empregada, que após 9 meses, gerou uma criança. A criança que nunca recebeu
nada do doutor Feitosa. Foi completamente esquecida por ele e a mãe, cujo poder
era mínimo, não conseguiu processar o pai por abandono. Soube que essa antiga
voltou a morar aqui, recentemente.
O velho mordomo
disse tudo o que Ernesto queria escutar, porém gostaria de ouvir mais pessoas. Ao
aproximar-se da primeira mulher do prefeito, foi imediatamente barrado por um
homem alto e corpulento que provavelmente era filho do falecido. O homem
alertou que a mãe não daria entrevista e que se qualquer jornalista voltasse a
importuná-la, haveria problemas. Ernesto não queria confusão e saiu de perto.
O jovem repórter,
então, avistou uma das sobrinhas do morto e procurou entrevista-la. A
princípio, a moça de cabelos longos e ondulados, olhos verdes e rosto juvenil,
não gostou da ideia de ser entrevistada e hesitou bastante antes de começar a
falar. Quando finalmente resolveu,
falou:
- Meu tio não era uma pessoa má, mas um homem ambicioso, com
um ego lá em cima. Se há alguém nesse mundo que o conhece melhor, esse alguém é
Edivaldo, seu motorista.
- Muito obrigado! – Agradeceu Ernesto.
Porém, antes de procurar tal motorista, foi abordado por uma
senhorinha baixa, vestida de preto. Ela estava nervosa e com bastante vontade
de falar:
- Eu ouvi o que a mocinha lhe falou. Isso vai desapontá-lo,
mas o motorista Edivaldo não veio. Sumiu desde ontem.
Ernesto ficou
intrigado.
- Como assim sumiu desde ontem?
- Não tivemos mais notícias dele depois que acharam o corpo
do doutor Feitosa. – Respondeu a senhora.
- A senhora é parente
de Arnaldo Feitosa? – Perguntou Ernesto.
- Era. Doutor Feitosa era meu cunhado. Casei-me com o irmão
dele, André, com quem nunca se deu muito bem. Meu marido está aqui. Se quiser
falar com ele, posso apresenta-lo.
Ernesto aceito e foi
apresentado ao irmão do velho assassinado. André era mais jovem que Arnaldo e
aparentava mais esportivo e bronzeado. O homem pediu para o jovem repórter sentar-se ao seu lado para ouvir o
que iria falar.
- Meu irmão era um desgraçado! Um desgraçado de marca maior!
Teve uma túia de filhos mas nunca assumiu nem metade, espancava as mulheres e
tratava mal seus familiares. Sem falar nos seus anos de mandato que foram
catastróficos, na minha opinião. Não fiquei admirado quando soube que ele havia
sido assassinado. Já era de se esperar. – Disse André.
Definitivamente,
pensou Ernesto, os irmãos não se entendiam e, talvez, odiavam-se. “Será que tal
ódio entre irmãos teria ocasionado um assassinato?”, pensava o repórter. Mas
Ernesto não estava lá para julgar ninguém. Decidiu seguir seu caminho e
procurar mais gente para entrevistar. Passou por perto novamente da primeira
viúva do senhor Arnaldo, esperando que ela houvesse mudado de ideia, porém, ao invés
de entrevista recebeu um belo soco do filho do falecido, que havia alertado
Ernesto para nunca mais passar por perto de sua família.
Com os lábios
inchados e sangrando, Ernesto foi socorrido por uma mulher de meia idade,
aparentemente bonita, que fora a segunda esposa de Arnaldo Feitosa, quem lhe
traiu com uma empregada, segundo o estranho mordomo. Simpática e paciente, a
mulher, chamada Rosana, resolveu falar-lhe o que sabia:
- Tenho minhas razões para odiar o Arnaldo. Todos nós temos
nossas razões para odiar alguém, isso é inevitável. Mas eu não odiava meu
ex-marido completamente. O que ele fez comigo foi imperdoável, mas eu não o
odiava a ponto de quere vê-lo morto. Graças àquele homem, tive 3 maravilhosos
filhos, das quais ele nunca deu atenção, nem mesmo quando éramos casados.
Alguma coisa em
Ernesto dizia que aquela mulher estava mentindo. Ela não falava confiantemente,
nem mesmo pronunciava direito as palavras. O repórter ficou desconfiado, porém
prosseguiu perguntando-lhe sobre o motorista do seu ex-marido.
Ah, Edivaldo. Era um bom empregado, porém estava agindo
estranho ultimamente. Sei disso, pois ainda mantemos contatos, sempre fomos
amigos. – Disse Rosana.
Ernesto suspeitou
daquilo. Como uma mulher que havia terminado o casamento com um homem há 20
anos ainda seria amiga de seu motorista? Procurando não parecer muito curioso,
o jovem repórter perguntou discretamente:
- Como ele estava agindo?
- Ele me ligava sempre, alegando não estar bem, que temia
fazer alguma bobagem e perder o emprego, até chorou. Talvez ele estivesse
passando por um período depressivo. E agora, ele sumiu! – A mulher fez uma pausa.
– Olhe, eu não acredito que tenha sido ele.
Ernesto compreendeu que aquilo queria dizer um
“fim da entrevista” e que a mulher era educada demais para dizer algo tão rude.
Resolveu tentar entrevistar outras pessoas e todas elas falaram sobre o
motorista, o irmão e as ex-mulheres do homem assassinado. Com o passar do
tempo, o velório terminou e o corpo de Arnaldo Feitosa foi levado para ser
enterrado em Recife, no mausoléu de sua família. Ernesto, que morava quase no
fim da cidade de Timbaúba, resolveu ir para casa e escrever suas matérias.
Chegando em casa, o
rapaz deparou-se com um carro estacionado em sua calçada. Um carro antigo que
sabia muito bem a quem pertencia. Entrou cuidadosamente na residência, sabendo
que a porta já estava aberta, e aguardou sua mãe na sala de estar. Quando uma
figura feminina de meia idade saiu de dentro de um quarto no corredor da casa,
Ernesto olhou-a por um momento e perguntou:
- Surpresa?
A mulher respondeu:
- Nunca imaginei que você teria tanta imaginação e coragem,
garoto. Interpretou perfeitamente seu papel de “jornalista chato e curioso”
hoje e deixará muita gente na cola da polícia, quando publicar sua matéria. Por quanto tempo manterá aquele
homem preso?
- Ainda estou pensando no que fazer com ele. Não quero sujar
as mãos novamente, mas acho que terei de fazer isso.
A mulher, ainda admirada com a atitude
criminal de seu filho, comentou:
- 20 anos e tão cruel quanto o pai. Lembro-me de ele ter
ficado maluco após me conhecer e saber que eu esperava um filho dele.
Ernesto, ao ouvir aquilo, não ficou
satisfeito. Odiava o pai mais que tudo no mundo, e havia o matado com muito
prazer. Após um tempo, o rapaz pegou sua faca e resolveu visitar o homem preso
em um dos quartos da casa.
O motorista Edivaldo
estava mantido como refém por Ernesto e sua mãe, por informar-lhes como se
infiltrar na mansão de Arnaldo Feitosa em troca de dinheiro, mas, em vez disso,
foi punido por saber demais. O pobre homem estava amordaçado em uma cadeira, completamente
imóvel e com medo. Sabia que não iria sair vivo no final.
Ao entrar no quarto e deparar-se com o velho motorista em
estado de choque, Ernesto começou a falar:
- Quero que saiba que eu não havia pensado direito, não
sabia que precisaria tanto mata-lo depois disso tudo, mas é o que devo fazer.
Só assim, tudo sairá conforme o planejado. É uma pena que você não tenha
recebido nenhum benefício. – O rapaz fazia carinhos no rosto suado e choroso do
homem amordaçado com uma faixa cobrindo a boca. – Tive que matar seu chefe,
pois ele fez coisas horríveis comigo, com minha mãe, com todos, até mesmo
contigo.
O rapaz fez uma
pausa, respirou um pouco antes de tirar a faca do bolso e enterrá-la no olho
direito do velho motorista.
- As pessoas são cruéis. – Disse Ernesto quando retirou a
faca da órbita direita de Edivaldo.
O corpo do motorista
foi encontrado 2 dias depois, em um terreno abandonado. Deixando a população da
pequena cidade de Timbaúba preocupada, pois descobriram que o Edivaldo não
havia matado o ex-prefeito e o verdadeiro assassina poderia estar em qualquer
lugar, até mesmo em casa comemorando a vitória com sua mãe.
Que dá hora. Muito bom. Foda!
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